segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014

Dormir bem na véspera?

Dizem que você precisa dormir bem antes de uma competição, para correr descansado. Já escrevi sobre essa besteira aqui, mas depois do último final de semana isso merece uma postagem especial. Não tenho nada contra uma boa noite de sono, principalmente durante a semana da prova (eu sempre tento dormir bem a partir de uns 4-5 dias antes), mas o fato é que uma boa noite de sono na véspera é um péssimo sinal. É sinal de falta de adrenalina, e a falta dela é praticamente uma garantia que seu desempenho não será bom. Para competir, você não pode estar se sentindo normal, relaxado. Competição é emoção, é nervosismo, é ansiedade! Somos humanos, afinal! Temos medos e inseguranças que nos acometem nos momentos de maior fragilidade e exposição.

Já escrevi e repito - eu nunca competi bem com uma boa noite de sono na véspera. Aliás, o efeito é justamente o contrário. As vezes em que melhor dormi também foram aquelas que mais me senti cansado e mole antes da largada e durante a prova.

Dois capítulos importantes dessa história foram meu recorde pessoal dos 10 quilômetros, feito depois de voltar de uma festa, e o Ironman Brasil, o qual, tentando controlar os nervos, dormi cerca de duas horas depois de muito rolar na cama. Neste final de semana a saga ganhou um terceiro capítulo. Fui numa festa de formatura no sábado, e na manhã seguinte teria uma dura competição de 30 quilômetros, com trilhas, morros, e areia de praia. Asfalto zero! Uma percepção de esforço próximo de uma maratona.

Sei que muitos diriam ser loucura, e no senso comum, realmente é. Porque nós estamos presos a conceitos e dogmas que acabam não sendo testados na prática. É claro que entre não dormir indo a uma festa e dormir pouco em casa descansando, a segunda opção provavelmente será a mais válida. Também não apóio uma vida boêmia misturada à rotina de atleta. Quem me conhece sabe que bebo quase nada e sou bastante disciplinado. E de forma alguma estou incentivando que você chute o pau da barraca na véspera. O fato de não conseguir dormir deve vir naturalmente, como resultado da adrenalina. Se você aceitar que isso pouco terá a ver com seu desempenho, poderá conseguir um grande resultado.

Fui na formatura, afinal, formaturas são imperdíveis - bebi bem de leve, mas não deu tempo para dormir. Como a competição ficava a cerca de 40 quilômetros de casa, e precisei chegar antes das 07h para retirar o chip (a largada foi às 7h30), fiquei na festa até o final, passei em casa, troquei de roupa, tomei um bom café, e fui correr.

Durante boa parte da prova me senti bem. Fui no primeiro pelotão de atletas, mas em certo trecho, em meio a uma trilha que não estava bem demarcada, acabamos pegando o caminho errado e perdemos alguns minutos, sendo ultrapassados por atletas mais lentos. Nesse momento forcei o ritmo para recuperar as posições, e quando terminei o trecho mais pesado de morros e trilhas, caindo na praia, estava em segundo lugar. Mantive essa posição até por volta dos 12 quilômetros, quando o Bruno, meu colega de treinos e competições, me alcançou e começou a imprimir um ritmo muito forte, abaixo dos 3m40s por quilômetro na areia. Percebi que o ritmo estava desconfortável e ainda era muito cedo para arriscar. Deixei-o ir, e mantive uma distância visual, que no entanto começou a crescer e chegou a cerca de 30s em determinado momento, quando só o via em linha reta. 

Porém, a altura dos 20 quilômetros comecei a crescer. Percebi que a diferença caía, bem lentamente, mas caía. E isso me motivou. Alcancei o Bruno por volta dos 25 quilômetros. A verdade é que a essa altura eu estava muito bem, e ele pagava o preço do forte ritmo de alguns quilômetros antes. Apertei o ritmo e fui abrindo distância, cruzando a linha me sentindo muito bem. Certamente ninguém diria que eu não havia dormido um minuto sequer. O meu último quilômetro foi o mais rápido de toda a prova. E ficou a sensação que poderia ter corrido mais, tão bem estava me sentindo.

É claro que de tarde descansei, e que isso não é o tipo de coisa que se vá fazer todo final de semana. Mas fica a sensação que, às vezes, vale a pena questionar o senso comum, os dogmas e aqueles pré-conceitos aparentemente óbvios e inquestionáveis. No esporte e na vida.

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